sábado, 22 de março de 2014

VERDADE, PERCEPÇÃO e REALIDADE na Comunicação Social: Propaganda e Jornalismo


Se tem uma coisa que me incomoda muito por onde passo e converso com vários profissionais de comunicação (principalmente publicitários e jornalistas) é a total descrença na VERDADE e a tremenda confusão que é feita entre os termos “VERDADE, PERCEPÇÃO e REALIDADE”.

Não pretendo aqui trazer uma discussão filosófica, embora fatalmente eu tenha que ir beber na fonte da filosofia. Pretendo aqui trazer algumas observações bem práticas para ver se acaba de uma vez por todas com essa confusão feita entra “verdade”, “percepção” e “realidade” e depois mostrar como estes termos podem (ou pelo menos deveriam) ser usados na comunicação social, principalmente na propaganda e no jornalismo.

Para começar, uma estória...

Encontrei essa estória narrada pelo Pe Paulo Ricardo em uma de suas aulas e que cabe muito bem para tomarmos como exemplo (Ps: Não sei se ele é o autor). Irei expor somente a situação.

Três cegos foram colocados para entrar em contato com um elefante. Depois do contato, cada um precisou descrever para os outros “o que é um elefante” e debater entre eles para chegarem a um consenso. O cego “T” foi colocado para apalpar a Tromba do elefante. O cego “P” foi colocado para apalpar uma das Patas do elefante. Já o cego “O” foi colocado para apalpar a Orelha.

Obviamente, quando os três ceguinhos foram colocados para discutir e tentar chegar numa definição do que é um elefante, eles não poderiam chegar, jamais, a um acordo mantendo apenas a sua própria experiência. Para chegarem a definição do que é um elefante, eles precisariam juntar as informações e, de preferência, ter acesso às informações que os outros 2 tiveram, além de acreditar no que os outros estavam falando.

Mas, tem uma coisa que seria imprescindível para os três chegarem ao que é um elefante: Os três precisariam ser sinceros consigo mesmo e ESTAR A PROCURA DA “VERDADE”, ou seja, responder a pergunta “O que de fato é um elefante?”.

VERDADE

Na situação narrada, reparem que existe uma VERDADE. O elefante é uma coisa REAL e independente do que digam, ou seja, da PERCEPÇÃO (experiência) que os outros tenham, ele tem suas características que o definem.

O cego “T” está de posse de uma parte da verdade. Ele não estará mentindo quando disser que um elefante é “algo cilíndrico, comprido e flexível”. De fato o elefante tem essa parte narrada por ele, mas elefante não é apenas isso. O mesmo acontecerá com os cegos “P” e “O” quando narrarem suas experiências (percepções).

Os 3, em conjunto, terão uma definição mais próxima do que de fato é um elefante, mas para poder ter essa aproximação os 3 precisam ser honestos o suficiente para assumir que não estavam com uma visão mínima do que é o animal e não trapacear. Além do fato deles terem que relatar com precisão sua experiência, ou seja, sua PERCEPÇÃO, e ela tem que estar também próxima da verdade.

PERCEPÇÃO

A “percepção” já tem relação com o a experiência que os indivíduos têm com o que está exposto. A percepção normalmente é bastante limitada justamente por isso somado ao fato que depende das circunstâncias que cada indivíduo está inserido.

O cego “P”, ao entrar em contato com a pata do elefante, estava sob certas circunstâncias que talvez os outros dois cegos não tenham a oportunidade de estar. Vamos supor que ao apalpar a pata do elefante o cego “P” o fez num dia calor e a pata estava seca e o cego “T” apalpou num dia de chuva e a pata estava molhada. Quando eles forem relatar tais experiências terão “visões” diferentes.

Assim, quando mais experiência você tem com o que foi exposto, mais próximo da verdade você poderá chegar. Agora, se alguém desejar trapacear para não assumir que está errado, chegar a conclusão correta (verdade) será praticamente impossível, juntando todos os pontos.

Vamos supor que tanto o cego “P” e o cego “T” tiveram contato com a pata e a tromba várias vezes. Quando um deles tiver a percepção que o outro teve e não quiser dar o braço a torcer que ele não estava 100% correto e esconder a sua percepção, nunca se chegará ao conceito correto do elefante.

Ou seja, para se chegar a VERDADE é preciso, como já disse, ser honesto o suficiente para assumir que a VERDADE INDEPENDE DA SUA PERCEPÇÃO e que se teve uma experiência limitada. Caso depois se perceba que estava errado, é necessário jogar fora o erro (ou pelo menos deixa-lo de lado, pois pode ser útil depois) e começar a trabalhar com as percepções corretas e sinceras.

REALIDADE

A realidade "é o que é", independente de sua percepção e opinião. Uma diferença importante entre realidade e verdade é que a primeira pode ser apenas uma fração da segunda.

O cego que apalpou a pata do elefante, ele está inserido na realidade caso ele relate o que ele percebeu e essa percepção for a correta. Mas, se ele mentir quanto a sua percepção e relatar de forma diferente aos outros cegos, eles não estarão inseridos na realidade caso não tenham a oportunidade de ter a mesma experiência do cego “P”.

Os outros dois cegos, confiando piamente no primeiro e este sendo um mentiroso, estarão fora da estrutura da realidade embora acreditem piamente que estão dentro dela.

O mesmo acontece se a percepção não for adequada. Vamos supor que no dia em que o cego apalpou a orelha do elefante, ele estava usando luvas de borracha. A verdadeira textura da orelha, ou seja, a textura real, não foi percebida pelo cego que começará a viver e relatar como real algo que não é.

VERDADE x PERCEPÇÃO x REALIDADE e RELATIVISMO

Chegando no ponto mais escroto (perdão pela palavra) e que me deixa mais puto (perdão novamente) e a ideia de dizer que TUDO É RELATIVO ou TUDO DEPENDE DO PONTO DE VISTA.

A relatividade nada mais é do que uma tentativa de justificar e afagar os indivíduos que vivem fora da realidade. A partir que se dissemina que “tudo é relativo”, se está condenando as pessoas a não chegar nunca à mais próximo da verdade e, pior, condenando o sujeito a viver fora da realidade dos fatos.

Como os indivíduos são limitados por natureza, ou seja, nunca conseguirá ter todas as experiências possíveis para se chegar a verdade, vamos desfazer desta e simplesmente incutir neles o que quisermos ou transformar tudo em caos, deixando todo mundo perdido, à deriva.

Notem que não estou dizendo que não existe a “relatividade”. Estou apenas dizendo que nem tudo é relativo e que “essa tal de verdade” existe e é independente de sua vontade ou opinião.

Incutindo a relatividade na cabeça das pessoas (sendo a única “verdade” é que “tudo é relativo”) se terá um indivíduo pronto para ser controlado, manipulado. Como já disse, os indivíduos são limitados por natureza e muita das coisas que têm conhecimento vem através de relatos de terceiros, assim, quando não se acredita mais na VERDADE, é possível construir “verdades” e o sonho de quem deseja poder (ou vender) será realizado e possível. É aí que entra o ditado “uma mentira contada diversas vezes vira verdade”, ou seja, você tira o indivíduo da estrutura da realidade.

Propaganda x Jornalismo

O que tem a ver “Verdade, Percepção e Realidade”, além do “Relativismo”, com a COMUNICAÇÃO SOCIAL, principalmente a propaganda e o jornalismo? A resposta é TUDO.

Não vou entrar aqui na questão da importância da comunicação para as relações (talvez em outra oportunidade eu fale), mas é indiscutível o fato que o ato de comunicar está relacionado a “verdade”, a “percepção” e a “realidade”.

A PROPAGANDA EM SI NÃO TEM COMPROMISSO ALGUM COM A VERDADE, ela trabalha na construção de uma (ir)realidade para fins determinados e com isso brinca com a percepção do público. Por isso que um bom publicitário precisa estudar bastante como os indivíduos percebem as coisas e o que mais chama a atenção destes.

Voltando à situação do elefante, a propaganda quer vender uma “bota pra elefante” e vai trabalhar em cima do público que tem a percepção de que o elefante é a pata, ou seja, o público dele é o cego “P”. Os cegos “T” e “O” ou entenderão nada ou, se na visão deles tudo for relativo, serão atingidos pela propaganda e convencidos de outra “realidade” e comprarão a bota que, claro, não servirá na tromba nem na orelha. Mas, estes últimos convencidos poderão tentar mexer na estrutura da realidade (frustrada, logicamente) e enfiar a bota na tromba do elefante (sufocando-o e matando - depois põe a culpa na propaganda... rs) ou enrola a orelha do elefante e coloca dentro da bota.

JÁ O JORNALISMO DEVERIA TER COMPROMISSO COM A VERDADE (acredito eu), CASO CONTRÁRIO SE TORNA PROPAGANDA (construção de realidade, brincando com a percepção dos indivíduo, para alcançar um fim). Um jornalista deveria investigar os fatos, fazer os contrapontos, ver a credibilidade das fontes e tentar chegar o máximo possível próximo à realidade.

Na estória do elefante, o jornalista deveria “entrevistar” os três cegos, além de outras pessoas e, se possível, ir ele mesmo ter a experiência de apalpar todas as partes do animal para transmitir ao público o conceito mais próximo possível da verdade. Mas, se o próprio jornalista não acredita na verdade, porque ele precisaria ter esse “trabalhão”? Se tudo é relativo, se a verdade não existe, se a minha percepção será fatalmente diferente dos demais, melhor eu fazer um “mix de nada” e mostrar o que me relataram.

Pode até parecer piada, mas infelizmente é assim que age hoje em dia a MAIORIA (não todos) dos jornalistas no Brasil e no mundo. Para dar uma informação, predem-se apenas nos relatos e, pior, quando aparece algo que é contrário ao que ele acredita, descarta “sem dó nem piedade” pois não faz parte dos seus interesses pessoais, ideológicos, objetivos, ou "construção de um mundo melhor".

O publicitário não tem compromisso com a verdade, embora tenha (deveria ter) compromisso com a sociedade e assumir responsabilidade. Já o jornalista, para não ser um agente (um idiota útil de propaganda) precisa ter compromisso com a verdade e, acredito eu, sua responsabilidade é ainda maior, já que este não se pinta de publicitário.

Concluindo...

A verdade existe, depende da percepção, da honestidade intelectual e do compromisso de quem a busca, mas é praticamente impossível chegar a ela em sua totalidade.

A percepção é a experiência que os indivíduos têm com o meio real ou através de relatos que podem ser fieis ou não a realidade.

A Realidade (com “R” maiúsculo) independe de opinião e percepção e pode ser apenas uma parcela da verdade. A “realidade” (entre milhares de aspas) pode ser construída a partir da percepção dos indivíduos, mas, se essa percepção for equivocada, a estrutura da realidade estará quebrada e que estiver “neste barco” estará vivendo fora da realidade.

Quanto ao RELATIVISMO, este é uma ferramenta para tentar manipular indivíduos, tornando mais fácil eles viverem numa irrealidade (ou numa realidade conveniente) e é a “menina dos olhos” de quem está no poder ou deseja chegar a ele.

Como disse no início, este post não tem a pretensão de fazer reflexões filosóficas sobre "Verdade", "Percepção" e "Realidade". O objetivo é apenas mostrar de forma prática o que são "Verdade, Percepção e Realidade" e o uso na Comunicação Social (principalmente na publicidade e no jornalismo).



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