sábado, 18 de outubro de 2014

A Construção de Um Discurso Político Difamatório


Ante de começar, quero dizer o porquê de eu ter deixado de postar desde agosto...

Eu pretendia fazer uma série sobre “Marketing Político”, mas a mesma foi inviabilizada. O motivo? Simplesmente esse ano está sendo o das CAMPANHAS POLÍTICAS MAIS SUJAS DA HISTÓRIA RECENTE DO BRASIL. O conceito de “Eleição é Guerra”, que tratei em outro post, assumiu o seu mais alto patamar em que praticamente tudo está valendo.

Devido a esse cenário e ao fato de a campanha a ser analisada seria a do PT, partido que na ocasião considerava o mais competente em termos de Marketing Político, (embora, hoje, esteja vendo que o pessoal do PSDB está colocando o do PT no bolso!) e esta campanha está sendo IMUNDA (primeiro turno detonaram a Marina com algumas rajadas em Aécio e este segundo turno está tudo concentrado em Aécio, como era de se esperar), decidi cancelar essa série para não tomar partido (embora minha preferência, desde o início, fosse de fato pelo candidato Aécio Neves e sua coligação por motivos que não vem ao caso).

O Marketing Político não é realizado apenas durante as campanhas eleitorais, ele vem sendo elaborado com bastante antecedência (acaba uma campanha eleitoral, já começa um novo projeto até o próximo processo eleitoral) e eu venho acompanhando a comunicação do PT de forma mais atenciosa há pelo menos três anos. Isso gerou um bom material para análise que, infelizmente, não caberia colocar em prática de modo, digamos, QUASE neutro.

O que me estimulou a voltar para fazer esse post foi o fato de eu realmente ter saturado dessa campanha e em ver tanta gente estarrecida com a formatação dessa Campanha Eleitoral de 2014. O que é feito durante uma campanha eleitoral para derrubar um candidato, fica na campanha e qualquer coisa que seja desmentida de nada valerá depois, pois o resultado já saiu e não há como provar que tal difamação (caso seja mentirosa) de fato tenha contribuído para a derrota do difamado (embora todo mundo saiba que o motivo foi a difamação, é praticamente impossível provar juridicamente).

Outro fator que me fez ter vontade de voltar a escrever foi o fato de eu ter previsto de forma quase que certeira o que aconteceria nas eleições para governador da Bahia, após ver o último programa dos candidatos Paulo Souto do DEM (aparecendo liderando as pesquisas) e Rui Costa do PT (candidato que estava ascendendo cada vez mais).

Após ver os programas a primeira pergunta que fiz foi: “Como é que o Democratas não previu que a campanha do PT iria atacar exatamente esse ponto no último programa eleitoral e não se antecipou (blindou)?”. Daí não foi muito difícil prever que Rui, que estava ascendendo, iria para o segundo turno na frente de Paulo Souto (só não esperava que o impacto seria tão grande a ponto dele ganhar logo no primeiro turno).

Como hoje a situação está bem parecida com o que está para ocorrer com o candidato Aécio Neves (sim, meu candidato), excetuando o fato de que é ele que vem em processo de ascensão, embora esteja, hoje, à frente nas pesquisas, resolvi mostrar para vocês um pouco dessa minha percepção para chegar à conclusão em relação às eleições para governador da Bahia. Vale destacar que falo de mesma situação e NÃO DO MESMO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO DISCURSO.

Construindo um Discurso Político Difamatório

Como disse na breve introdução, o Marketing Político não acontece apenas durante o processo eleitoral. A campanha eleitoral é o final de todo o trabalho realizado antecipadamente. Então é muito comum plantar notícias sobre um determinado candidato com bastante antecedência para usá-la como validadora (desenterrando-a) durante a campanha eleitoral (ou em até mais de uma campanha eleitoral), assim como arquivar as notícias verdadeiras sobre escândalos que o oponente venha a cometer, fazendo uma espécie de “clipping”. Como esse é um trabalho constante e que continua ocorrendo em todas as etapas que listarei não a considero como uma etapa específica.

Eu identifico NO MÍNIMO QUATRO ETAPAS BÁSICAS, sendo que dentro dessas etapas básicas podem ter (e normalmente têm) outras pequenas etapas. As 4 etapas básicas são:

01) Identificar um grupo sensível (ou mais) para ser acionado na hora de atacar
02) Procurar entre os discursos (propagandas, comícios ou debates) algo que possa ser interpretado de uma maneira que afete um desses grupos, fazendo um arranjo discursivo
03) Plantar Notícias e estimular meios de divulgação, promover ataques através de agentes e manipular notícias antigas ou de difícil averiguação
04) Lançar no último programa e/ou no último debate a "bomba", quando o oponente não tem mais chance de se defender a altura.

Etapa 1: Identificar um grupo sensível (ou mais) para ser acionado na hora de atacar

Atualmente existem 3 grupos que estão bem sensibilizados e que são bem relevantes para campanhas eleitorais: a) Mulheres, devido ao movimento feminista; b) Negros, devido ao movimento negro; c) LGBTs, devido aos movimentos gays. Lembra que falei que o processo de “Marketing Político” começa muito antes? Os partidos que estão mais imersos nos movimentos sociais associados a esses grupos são exatamente o PT e seus aliados, sendo assim muito fácil acioná-los.

O trabalho em cima desses grupos é feito durante muito tempo, tanto de “implantação de comandos” para reagirem quanto de fomentação da insatisfação, deixando-os sempre insatisfeitos, sempre promovendo a “luta de classes” e se colocando como um dos poucos (se não o único) que de fato olha para esses grupos.

No caso que estou vendo do Aécio Neves, o grupo selecionado foi o de MULHERES (e se for negra e/ou homossexual, melhor ainda!). Esse grupo (o de mulheres) ainda servirá para tentar frear o candidato Aécio Neves nas respostas em relação a Dilma, fazendo-o pensar mais vezes do que pensaria caso o adversário fosse do sexo masculino.

Etapa 2: Procurar entre os discursos (propagandas, comícios, debates, etc...) algo que possa ser interpretado de uma maneira que afete um desses grupos, fazendo um arranjo discursivo.

Identificado(s) o(s) grupo(s) e sabendo como reage(m) a determinados comandos (discursos), basta aguardar a oportunidade de “pinçar” algo que o oponente disse e que possa ser interpretado (mesmo que de forma forçada) como um ataque aos valores de tais grupos. Para fazer isso, basta colocar uma pessoa (ou uma equipe) especializada em “métodos de interpretação” (pode ser semioticistas ou analistas de discursos, por exemplo) com objetivo direcionado de “captar possibilidades interpretativas”. Hoje em dia não é muito difícil encontrar (deturpar) discursos para que pareçam “racistas”, “machistas” ou “homofóbicos”.

Esse discurso pode, inclusive, ser estimulado, trazido à roda através de temas que tenham, de modo secundário, um dos grupos selecionados.

Dilma, por exemplo, e apenas um exemplo, quando perguntou para Aécio (em um dos debates) sobre SEGURANÇA, inseriu “SEGURANÇA DA MULHER, deixando claro que queria que fosse tratado desse assunto. Falando de MULHER, seria muito mais fácil conseguir pinçar um discurso que parecesse “machista”, afinal, estaria se falando de violência contra a mulher que em praticamente todos os casos é realizada por homens. Outro fator importante desse estímulo é que prepara o público para o tema, deixando-o mais sensível.

Bom... Para este caso, existe uma notícia de 2009 em que Aécio Neves é acusado de bater em sua namorada (atual esposa e mãe dos filhos gêmeos dele) publicamente numa festa, fato que já foi desmentido e esclarecido (aqui tem outra fonte "Informação falsa: Aécio Neves agrediu namorada Letícia Weber em 2009"). Então, trazer o tema “Violência Contra a Mulher” pode trazer à baila essa notícia (próxima etapa).

Etapa 3: Plantar Notícias, estimular meios de divulgação, promover ataques através de agentes e manipular notícias antigas ou de difícil averiguação.

Essa é exatamente a etapa em que todo o trabalho sujo é colocado em prática. Tendo o oponente fisgado a isca, é partir para as manipulações e deturpações.

No Debate da Band para o Segundo Turno (14/10/2014), segundo os petistas, Aécio Neves foi machista ao se dirigir a Dilma Rousseff da forma como se dirigiu (se foi uma reação ou não para esse processo é irrelevante, mas o fato é que provocam o tempo inteiro para alcançar o objetivo) e quando ele usou os termos “Trabalhador” e “Dona de Casa” (detalhe que Dilma TAMBÉM USA esses termos para se referir de forma similar).

Colocou-se então uma nota no site oficial do PT denominada “Aécio dá show de machismo no debate da Band”, usando o termo “Machismo” que faz ativar o movimento feminista e toca muitas mulheres que recebem uma carga midiática pesada de tudo que ELES (do partido e movimento feminista) acreditam ser “machismo”.

O primeiro “estímulo” fora do site partiu das mídias sociais, local onde o engajamento é bastante significativo e tem um bom poder de viralização. As imagens abaixo foram tiradas da Fanpage Oficial do Partido.


Depois precisam vir outros reforços como este para manter a unidade e manter o tema sempre vivo.


No Debate do SBT (16/10/2014) o candidato Aécio Neves (acertadamente, ao meu ver) também não poupou ataques verbais em resposta às provocações da candidata Dilma Rousseff. Aécio tratou a atual presidente de igual para igual (com igualdade e não considerando a mulher como “sexo frágil”, que por sinal as feministas odeiam ser chamadas disto, e em consonância com a imagem de "forte" que a atual presidente adota), respondendo os ataques à altura, aumentando a temperatura em outras ocasiões. O clima do debate foi bastante tenso e carregado (chegando até a candidata Dilma passar mal durante uma entrevista após o debate).

Essa atitude de Aécio (repito, acertada, mesmo com as consequências que podem/poderiam gerar) abriu a porta para dizer que o candidato tucano não respeita mulheres e é agressivo com mulheres (não somente com Dilma, mas com mulheres em geral). Isso pode trazer à tona a notícia de 2009 em que o acusaram de ter agredido a namorada na festa (link na Etapa 2) e implantar o conceito Aécio machista que é agressivo com mulheres. Obviamente, não iriam deixar isso em branco e Lula, em um comício em Manaus disse que Aécio foi Ignorante COM UMA MULHER. Reparem que ele usou a expressão “uma mulher” e não com a candidata Dilma Rousseff. Por que isso? Ora! Para dar andamento na fixação da imagem que pretendem dar a Aécio Neves (a imagem de machista) e como Dilma Rousseff irá atacar o candidato, cada vez que ele ataca-la o PT irá tentar dizer que o candidato não respeita o fato da presidente da república ser mulher, dando a entender que ele só a trata dessa forma porque trata-se de uma mulher e que por isso ele é um "troglodita machista".

Trabalhando com essa declaração de Lula com a notícia de 2009, podem agora trazer vários reforços. Um deles foi associar o artista Dado Dolabella que já foi acusado por agredir namoradas (por que não trazem o Netinho de Paula, cantor e do partido PCdoB, aliado do PT?) e diversos escândalos de “molecagem”.


A militância pode ser acionada de forma ativa ou passiva. Ativa é quando essa militância está sendo gerenciada pelo partido, passiva é quando essa militância (ou militante) é pega pelos estímulos da militância ativa, da mídia ou do próprio partido.

A manipulação da postagem abaixo não sabe-se ao certo se foi “ativa” ou “passiva”, mas isso pouco importa para o resultado final (aliás, conseguir esse grau de engajamento de militantes passivos é o que deseja todo candidato). O importante, agora, é ver como a notícia foi manipulada!

(Sem link, pois trata-se de um perfil pessoal)

Repare que o texto ao lado é EXATAMENTE o mesmo da postagem de 2009 (arquivada), mas a imagem da mulher agredida não condiz com a notícia, ela foi usada apenas para mostrar um rosto conhecido na mídia e sem relação com o caso listado. Mas isso pouco importa, pois a notícia da imagem é muito antiga (embora tenha voltado à tona pois o agressor neste caso é um ator e este está sendo acusado de ter agredido a mulher recentemente). Essa imagem da mulher agredida, segundo fonte, é de 2006, mas segundo acusação o ator agrediu OUTRA mulher no início deste ano (“Ex-namorada de Kadu Moliterno relata que foi agredida pelo ator após descobrir traição e presta queixa”).

Repararam a “confusão”?

Aécio foi acusado de ter agredido uma mulher em 2009, trazem uma mulher que foi agredida por outra pessoa em 2006 e que não tem relação com o fato recente que trouxe a notícia. Resumindo, a pessoa para verificar essa notícia vai rodar bastante.

Essa outra parte de uma militância organizada, a UJS, que e fortemente ligada ao Partido dos Trabalhadores. Repare que eles trazem uma capa de jornal antigo e a verificação é praticamente inacessível.


Etapa 4: Lançar no último programa e/ou no último debate a "bomba", quando o oponente não tem mais chance de se defender a altura.

Obviamente aqui, nesta etapa, trata-se de especulação. Trata-se de UMA POSSIBILIDADE. Como “Eleição é Guerra”, é um jogo de xadrez, é preciso ver a movimentação do adversário. O Marketing do PT pode optar por antecipar ou abortar e colocar outro tema que ele julgue mais “grave” (por exemplo, está também em evidência o caso do Helicóptero com quase meia tonelada de pasta base de cocaína e que também já foi desmentido e esclarecido). O Marketing do PSDB pode resolver esclarecer isso antecipadamente e neutralizar a ação do PT. Enfim, só a movimentação poderá dizer. Há também outras possibilidades de desfecho, mas aqui irei me ater a notícia inicial (a de 2009, que Aécio foi acusado de ter agredido a namorada).

Com todo esse terreno preparado, essa bomba pode ser lançada no último programa eleitoral de TV e Rádio ou no último debate. Como este ano o último debate será um dia antes do último programa eleitoral, lançando o tema no último debate ainda haverá tempo de tentar desfazer (embora o impacto da resposta não será o mesmo). Então...

No dia 24/10, no último programa, pode ser lançado para a massa a notícia de que Aécio agrediu namorada em festa que em si é grave. O candidato não terá outro programa para desfazer e o trabalho em mídias sociais não terá tempo suficiente para viralizar a defesa à altura. O candidato difamado terá que contar com a “sorte” de os eleitores não acreditar na denúncia ou a denúncia não ter um peso tão grande (difícil, pois é um tema de comoção).

Conclusão

A ideia deste post foi mostrar o possível caminho para difamar o adversário político. Mostrar o caminho para a construção de um discurso político difamatório e não a resolução do problema ou alternativas para blindar esse discurso. Até porque, é preciso ter muitas informações (pesquisas e o plano estratégico geral) para ver qual linha adotar. Pode ser que, para este caso, a equipe de Aécio Neves tenha material para difamar a Dilma e a altura de tornar esse fato pequeno. Pode ser também que a equipe do PT tenha material mais grave para inserir no último programa eleitoral e que seja melhor antecipar isso para um debate.

Gostaria de deixar claro também que uso o termo “acusado” para me referi a “denunciado” e que não necessariamente foi condenado.

Importante deixar claro também que considero o “Discurso” aqui o da campanha para “colar” essa imagem e não uma “análise do discurso de uma frase, parágrafo ou texto”.

Por fim, gostaria de deixar claro também que o fato de eu estar trazendo como exemplo a campanha do PT não significa que a do Aécio Neves esteja isento de sujeiras.

[ATUALIZAÇÃO 17h30]

Uma hora depois de publicar esse post tive acesso ao vídeo do Comercial do PT que começou a ir ao ar hoje na TV e Rádio que fala exatamente o que escrevi. Olhem como estão construindo em Aécio a imagem de que AGRIDE MULHERES! Não vai demorar para tocarem no assunto de 2009!

(Ps: Se o vídeo sair do ar, visto que a equipe de Aécio Neves entrou com ação no TSE para retirá-lo do ar e entrou com outra ação processando a candidata Dilma Rousseff contra difamação, me avisem para eu subir em outra plataforma)




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